Um mês do primeiro caso de coronavírus no Brasil: o que mudou para o mercado desde então?

Um mês do primeiro caso de coronavírus no Brasil: o que mudou para o mercado desde então?

março 26, 2020 Off Por Today Newsroom

índices gráfico bolsa mercado alta baixa coronavírus covid-19
(Getty Images)

SÃO PAULO – Um mês apenas – e o cenário para a economia, bolsas e investimentos mudou completamente para o Brasil (e para o mundo) em decorrência de um verdadeiro “cisne negro” para o mercado.

No último dia 26 de fevereiro, foi confirmado o primeiro caso de uma pessoa infectada pelo coronavírus no país, fazendo com que uma ameaça antes longínqua se transformasse em um problema gigantesco para a economia real. Até às 12h desta quinta-feira (26), eram 2.598 casos confirmados do novo coronavírus (Sars-Cov-2) no Brasil com 63 mortos, 48 deles em São Paulo.

A doença se espalhou pelo mundo, trazendo sérias indicações de uma recessão global e, consequentemente, levando a revisões para a economia brasileira.

Desde então, considerando o fechamento do Ibovespa de 21 de fevereiro (sexta-feira antes do primeiro caso confirmado e anterior ao feriado de Carnaval, que levou a B3 a abrir somente na quarta-feira) e o fechamento do último dia 25 de março, o índice já registrou uma queda de 34,07%, passando de 113.681 pontos para 74.956 pontos, enquanto o dólar passou dos R$ 5.

O índice passou a entrar em um forte movimento de queda a partir daquela sessão, mas principalmente por conta da preocupação com o avanço do coronavírus para outros países além da China, especialmente com o aumento de casos na Itália, Coreia do Sul e Irã, que já tinha repercutido nos dias anteriores que a bolsa brasileira estava fechada.

Como é uma doença altamente contagiosa, para conter o avanço e o esgotamento do sistema de saúde, muitos países passaram a adotar medidas de isolamento social, fecharam as fronteiras e o turismo global foi extremamente limitado, afetando uma economia global já frágil.

Naquele dia 26 de fevereiro, o Ibovespa caiu 7%, o que era até então o pior fechamento desde 18 de maio de 2017, o fatídico “Joesley Day”. Porém, era apenas o começo. Desde então, a B3 teve que paralisar as negociações na bolsa e acionar o “circuit breaker” por seis vezes, sendo que duas vezes em apenas um pregão.

O mecanismo é acionado pela primeira vez num pregão quando o Ibovespa cai mais de 10%, interrompendo a negociação por meia hora, e acionado pela segunda vez quando o benchmark da bolsa despenca mais de 15%, fazendo com que as negociações fiquem paralisadas por uma hora. O circuit breaker foi acionado uma vez no pregão durante a atual crise nos dias 9 (quando caiu 12,17%), 11 (queda de 7,64%), 16 (baixa de 13,92%) e 18 (queda de 10,35%) de março; o mecanismo foi acionado duas vezes no pregão do dia 12, sessão esta em que o Ibovespa fechou em baixa de 13,91%.

Durante esse mês de forte queda para a bolsa brasileira, curiosamente, a maior baixa do Ibovespa não foi de uma ação seriamente impactada pelos efeitos do Covid-19, mas ela acabou sofrendo com o sell-off do mercado já que enfrentava problemas internos. Trata-se do IRB (IRBR3), que viu suas ações caírem 72,32% no acumulado do período: mudanças nos cargos de liderança por alegações de manipulação de mercado, questionamentos sobre o balanço e até mesmo uma ação da Polícia Federal vêm abalando a empresa de resseguros desde o início de fevereiro, quando a bolsa ainda não refletia tanto os temores com o coronavírus.

Já as quedas seguintes refletem bem o cenário da crise atual: CVC (CVCB3), Gol (GOLL4) e Azul (AZUL4) registram baixas respectivas de 69,72%, 67,65% e 65,55%. Por conta da queda da demanda por voos e das restrições de viagens, as companhias tiveram um forte corte da capacidade de operação (confira clicando aqui). A Gol reduziu em cerca de 92% a oferta nos mercados domésticos e 100% nos internacionais, enquanto a Azul cortou sua capacidade em 90% entre 25 de março e 30 de abril. Smiles (SMLS3) também teve queda forte no período, de 63,11%.

E, se a maior parte das varejistas sofreu, a Via Varejo (VVAR3) foi a mais impactada do setor no período, com queda de 65,69%. “A empresa está passando por um turnaround, tem um negócio muito cíclico e subiu muito nos últimos meses, quando o mercado estava otimista. É razoável que caia tudo isso em meio ao desespero do mercado”, afirma Carlos Herrera, estrategista-chefe da casa de análise Condor Insider, ao InfoMoney (veja mais clicando aqui).

A Petrobras (PETR3;PETR4), antes com boas perspectivas em meio aos desinvestimentos e foco em exploração e produção, viu suas ações caírem 52% no mesmo período por uma combinação da forte redução da demanda por conta do impacto do coronavírus nas economias globais e de uma guerra de preços entre a Arábia Saudita e a Rússia, que levou a um aumento da produção do primeiro país. Porém, segundo aponta o Goldman Sachs, nem mesmo um eventual fim da disputa entre os dois países pode evitar excesso de petróleo (veja mais clicando aqui).

Já entre as menores baixas (afinal, nenhuma ação do Ibovespa subiu nesse período), os destaques ficaram com empresas varejistas de consumo básico, como o Carrefour (CRFB3) e a RD (RADL3), que viram a demanda por seus produtos aumentar nesse período, mas podem sofrer no médio prazo por conta do impacto do coronavírus na economia (veja mais aqui). Elas caíram, respectivamente, 3,02% e 7,97%.

Confira abaixo as 10 maiores e as 10 menores baixas do Ibovespa no último mês:

Maiores baixas do Ibovespa  Menores baixas do Ibovespa
Empresa Ticker Desempenho Empresa Ticker  Desempenho
IRB IRBR3 -72,32% Carrefour CRFB3 -3,02%
CVC CVCB3 -69,72% RD RADL3 -7,97%
GOL GOLL4 -67,65% Hypera HYPE3 -9,61%
Via Varejo VVAR3 -65,69% JBS JBSS3 -15,13%
Azul AZUL4 -65,55% Telefônica VIVT4 -17,22%
Smiles SMLS3 -63,11% B2W BTOW3 -17,54%
Cogna COGN3 -54,75% Rumo RAIL3 -18,17%
Petrobras ON PETR3 -52,84% Vale VALE3 -18,51%
BTG Pactual BPAC11 -52,81% Hapvida HAPV3 -18,93%
Yduqs YDUQ3 -52,16% Taesa TAEE11 -19,42%

*pregões entre 21 de fevereiro e 25 de março

Revisões de cenário

A preocupação com os impactos na economia brasileira passou a ganhar força nas duas últimas semanas, quando os casos da doença começaram a crescer e as expectativas pelas medidas para tentar conter uma aceleração extrema no número de infectados levaram a revisões drásticas para baixo na atividade.

Com isso, várias instituições passaram a revisar suas projeções para baixo, começando a prever inclusive uma recessão no Brasil por conta do coronavírus (veja mais aqui). Segundo estudo do Centro de Macroeconomia Aplicada da FGV (Fundação Getulio Vargas), a pandemia pode provocar uma perda de até 4,4% no PIB (Produto Interno Bruto) brasileiro em 2020, o que seria a maior queda nominal (sem considerar efeitos da inflação) da economia desde 1962, quando começa a série histórica disponível no site do Banco Central.

Entre os motivos para as drásticas revisões, está o espaço relativamente limitado para o governo atuar do lado fiscal e os efeitos do lockdown [isolamento] para a economia, que vem inclusive gerando debates entre empresários, economistas e políticos sobre se a quarentena de todas as faixas etárias da população pode levar a uma quebra generalizada de empresas.

Para conter os efeitos do coronavírus na economia, o Banco Central anunciou um programa no valor  de R$ 1,2 trilhão (US$ 233,8 bilhões), para injetar liquidez por meio da compra de pacotes de carteiras de empréstimos bancários; novas regras que permitem aos bancos oferecerem a empresas e famílias empréstimos maiores e melhores condições, entre outros.

Já o estímulo fiscal veio através de um programa de R$ 150 bilhões para auxiliar a população mais vulnerável e proteger empregos. Além disso, houve a aprovação, pelo Congresso, de decreto presidencial que declara emergência nacional em torno do coronavírus, permitindo ao governo renunciar às metas fiscais e liberar recursos orçamentários. Porém diante da atual incerteza do cenário, muito se questiona se esses estímulos vão ser suficientes.

Nesse cenário, muitas casas já cortaram as suas previsões para o Ibovespa, mas ainda veem espaço para o índice subir. O Morgan Stanley cortou a projeção de 125 mil pontos para 85 mil pontos (veja aqui), o Itaú BBA passou de 132 mil pontos para 94 mil pontos (veja aqui), enquanto o corte mais drástico ficou com o JPMorgan, que cortou de 126 mil para 80.500 pontos (confira aqui).

“Os lucros locais devem ter uma queda de 20% em 2020 e uma alta de 12% em 2021”, afirmam os analistas do Morgan. Porém, apontam: o país enfrentará uma desaceleração econômica acentuada, mas temporária e com uma rápida recuperação (“recuperação em forma de V”).

Nesse novo cenário de maior aversão ao risco do mercado, muitos analistas acabam apontando preferência por ações de setores reconhecidamente mais defensivos, como elétricas. Mas atenção, é preciso também diferenciá-las, já que algumas estão sendo impactadas pelo atual cenário (veja mais aqui). Ações de grandes bancos privados também são destacadas por analistas (confira aqui).

Porém, o cenário de forte incerteza é o que acaba predominando, gerando muita volatilidade no mercado, uma vez que não se sabe qual será a duração da pandemia e a quantidade de recursos que será necessária para salvar as economias. A expectativa é de que as fortes emoções para o mercado e possíveis revisões para a economia perdurem nas próximas semanas.

Aprendizados em tempos de crise: uma série especial do Stock Pickers com as lições dos principais nomes do mercado de ações. Assista – é de graça!

waiting...