Ganhos dos gestores vão às alturas com boom dos multimercados
dezembro 7, 2020
(Bloomberg) — Enquanto os fundos de hedge encolhem em todo o mundo devido aos baixos retornos e às altas taxas de administração, um país está contrariando essa tendência: o Brasil, onde os gestores estão deixando seus empregos nos bancos para tentar a sorte em busca de potenciais recompensas multimilionárias.
“Você tem hoje tanto dinheiro à disposição das gestoras independentes que elas conseguem ter lucro super rápido, então elas têm muito dinheiro para pagar os gestores”, disse Leon Goldberg, sócio da XP Inc., a maior corretora do Brasil, em uma entrevista. “Muitas delas estão tirando talentos dos bancos e uma da outra também.”
Executivos sêniores estão abandonando suas longas carreiras em grandes bancos, incluindo JPMorgan Chase & Co., Credit Suisse Group AG e Itau Unibanco Holding SA, para criar suas próprias gestoras de fundos multimercados, a versão brasileira dos fundos de hedge, e de fundos de ações, atraídos pela chance de mais independência e ganhos mais polpudos.
Um gestor de fundo multimercado pode ganhar mais de R$ 25 milhões por ano no Brasil em uma empresa independente, enquanto um punhado de estrelas do mercado podem fazer até R$ 100 milhões em compensação total, de acordo com pessoas familiarizadas com a remuneração do setor.
Executivos de banco que chefiam uma gestora de recursos de terceiros ou a tesouraria raramente ganham mais de R$ 15 milhões, disseram as pessoas, pedindo para não serem identificadas discutindo políticas de compensação privada.
As gestoras independentes também têm outras vantagens.
“Quando você é dono de sua gestora, você não tem um limite de remuneração como teria em um banco”, disse Ricardo Amatto, sócio da empresa de busca de executivos Heidrick & Struggles no Brasil.
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“Além disso, todos os bancos praticamente diferem a remuneração variável, em geral por três a quatro anos, enquanto em uma gestora você recebe todo o seu dinheiro de uma vez.”
Há vantagens fiscais, também. Os sócios de uma gestora recebem a maior parte de sua remuneração por meio de dividendos, disse Amatto, e esses pagamentos são isentos de Imposto de Renda no Brasil. No banco, a remuneração é tributada em 27,5%.
“Então você pode ver por que tantas pessoas seniores deixaram os bancos para se tornarem empreendedores no setor de gestão de fundos de investimento”, disse Amatto.
Entre as principais saídas: Sylvio Castro, ex-diretor de investimentos da unidade de private banking do Credit Suisse no Brasil, que deixou o banco para criar sua própria gestora de fundos multimercado, e Jorge Oliveira, ex-executivo do JPMorgan, que foi para uma gestora fundada pelo veterano do JPMorgan Giovani Silva substituindo um executivo que saiu para criar sua própria empresa.
O setor de gestão de fundos de investimento local no Brasil, de R$ 5,75 trilhões, é o maior da América Latina e é historicamente controlado por grandes bancos que investiam o dinheiro dos clientes em produtos de renda fixa de curto prazo.
Isso era bom o suficiente quando os retornos giravam em torno de 14% há quatro anos. Agora que a taxa básica de juros no país caiu para apenas 2%, abaixo da inflação, os investidores estão mais do que dispostos a pagar até 2,5% ao ano em taxas de administração, mais 20% em taxas de performance, para tentar obter retornos mais elevados em um fundo multimercado.
“As baixas taxas de juros estão alimentando o sonho de crescimento dos gestores no Brasil”, disse Patrick O’Grady, presidente da Vitreo, uma empresa de investimentos e corretora com R$ 7 bilhões sob gestão.
O boom dos multimercados se manteve mesmo durante a pandemia, também graças ao Banco Central, que injetou R$ 1,1 trilhão de liquidez no sistema financeiro do país e evitou uma crise bancária, reduzindo depósitos compulsórios e exigências de capital.
Os fundos multimercado tiveram ingressos líquidos recordes de R$ 88,8 bilhões este ano até outubro no Brasil, depois de captar R$ 77,3 bilhões no ano passado, de acordo com a Anbima, a associação dos mercados de capitais do país.
“Ainda há cerca de R$ 7 trilhões investidos em produtos de renda fixa no Brasil, com retornos reais negativos, então a migração para ativos mais arriscados, como ações, deve continuar”, disse Sara Delfim, que ajudou a fundar a Dahlia Capital em 2018 após nove anos na Bank of America Corp. “As perspectivas para a indústria local de fundos permanecem positivas.”
É um grande contraste com o que está acontecendo globalmente. Em todo o mundo, os fundos de hedge registraram neste ano quase US$ 55 bilhões em resgates até outubro, depois de perder US$ 102 bilhões em 2019, de acordo com dados compilados pela eVestment. Os investidores globais têm buscado produtos passivos e mais baratos, após anos sofrendo com os retornos que ficaram atrás dos índices de referência.
No Brasil, empresas como a Genoa Capital Gestora de Recursos estão colhendo os frutos. Lançado em junho, o fundo multimercado da empresa levantou quase R$ 7 bilhões em dois meses e agora está fechado para novos investimentos.
Fundado por Andre Raduan, Mariano Steinert e Emerson Codogno, veteranos que eram da unidade de gestão de recursos de terceiros do Itaú, o fundo cobra 1,9% a 2,5% em taxas de administração e 20% em taxas de performance.
Os pioneiros da indústria também estão levantando mais recursos, como a JGP Asset Management, de Andre Jakurski, que tem mais de R$ 27,5 bilhões sob gestão, e a Verde Asset Management, de Luis Stuhlberger, com mais de R$ 46 bilhões.
Embora novas gestoras sejam abertas em um ritmo vertiginoso, sua lucratividade e sobrevivência não são garantidas.
“A gestão de fundos é um negócio de escala”, disse Amatto, o recrutador de executivos. “Você precisa crescer para ser lucrativo e ter um bom desempenho. Então eu vejo muita gente que começa com custos fixos muito altos, subestimando os riscos e a concorrência”.
Noventa novas gestoras foram criadas apenas este ano no Brasil, segundo a Anbima, mas cerca de 28 fecharam no mesmo período. Para sobreviver, algumas empresas podem precisar se juntar com outras por meio de fusões para ganhar força.
“Sempre há espaço para gestoras que geram retorno”, disse o veterano da indústria José Tovar, presidente da Truxt Investimentos, que administra cerca de R$ 18 bilhões. “O desafio é entregar – e rápido”.
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