BB tem bom resultado, mas deixa pergunta: como a nova gestão lidará com os desafios do banco estatal?
agosto 6, 2020SÃO PAULO – Fechando a safra do segundo trimestre de 2020 dos grandes bancos, o Banco do Brasil (BBAS3) registrou números que agradaram os analistas apesar de, na linha dos outros bancos, ter registrado aumento de provisões para devedores duvidosos por conta da pandemia do novo coronavírus. Isso, mais uma vez, impactou os números do lucro e da rentabilidade da instituição estatal.
O BB teve lucro líquido ajustado de R$ 3,311 bilhões no segundo trimestre deste ano, queda de 25,3% na comparação com o mesmo intervalo de 2019. No primeiro semestre, o lucro líquido ajustado foi de R$ 6,706 bilhões, cifra 22,7% menor que a vista um ano antes.
A rentabilidade sobre o patrimônio líquido, refletida no indicador RSPL, seguiu sob o efeito do aumento das provisões por conta da pandemia. No critério mercado, chegou a 11,9% no segundo trimestre contra 12,5% no primeiro. No conceito ajustado, foi de 10,0% ante 10,5%, nesta ordem.
Contudo, aponta o Credit Suisse, as tendências observadas na linha de receita foram melhores do que o esperado. Além disso, os níveis de capital CET-1 (índice de Basileia de melhor qualidade) tiveram melhora de forma sustentável para 10,6%, enquanto o banco fortaleceu ainda mais seu balanço para provável aumento da inadimplência a caminho – o índice de cobertura aumentou de 200% para 224%, também registrando um bom desempenho da carteira renegociada.
As receitas de tarifa caíram 6,4% no ano, a R$ 6,965 bilhões no trimestre encerrado em junho e 1,4% na comparação trimestral, números considerados fracos pelo Credit mas, ainda assim, melhores do que o esperado.
Já as provisões prudenciais adicionais do Banco do Brasil para possíveis calotes atingiram R$ 2,0 bilhões de reais, em linha com o aumento das provisões adicionais reportadas pelo Bradesco (R$ 3,8 bilhões de reais), Itaú Unibanco (R$ 1,8 bilhão) e Santander (R$ 3,2 bilhões).
Vale destacar ainda que, além das provisões, houve um grande impairment no valor de R$ 1,3 bilhão no trimestre (versus R$ 378 milhões no primeiro trimestre e R$ 373 milhões no mesmo período do ano passado), pois o banco decidiu contabilizar o impairment de operações de grandes empresas que já eram classificadas como ativos problemáticos.
Além disso, os analistas do Credit reforçam ainda que a margem financeira bruta (NII, na sigla em inglês) teve um bom desempenho, ao totalizar R$ 14,5 bilhões, alta de 3,8% na comparação trimestral e de 8,2% na base anual (ainda que desacelerando frente a alta de 9,9% do trimestre anterior). Um ponto positivo é a menor despesa de captação (um efeito positivo da Selic mais baixa no trimestre).
Por outro lado, os spreads (diferença entre o que o banco gasta para captar e o que cobra do consumidor final) tiveram baixa de 16 pontos-base sequencialmente, em meio à queda de 23 pontos-base da participação na carteira de varejo, voltada para a pessoa física, enquanto o segmento corporativo teve queda de 17 pontos-base.
Já para o Bradesco BBI, a margem com clientes poderia ser um pouco melhor, mas não pode ser destacada como negativa, já que teve alta sequencial.
Para os analistas do banco, contudo, ao contrário dos pares privados (que registraram uma queda na participação do varejo), não houve uma mudança significativa no portfólio da carteira de crédito no trimestre. O total da carteira de empréstimos ficou praticamente estável, com queda de apenas 0,5% no trimestre, com baixa de 0,2% para pessoas físicas e de 0,6% para as jurídicas.
Além disso, seguindo a tendência observada no setor, a qualidade do crédito melhorou, com a taxa de inadimplência caindo 40 pontos-base, de 3,2% para 2,8%. Levando em conta a pouca alteração no portfólio de empréstimos, os analistas esperavam uma maior margem financeira ainda maior – algo que, no entanto, não aconteceu.
Victor Schabbel e Sofia Viotti, analistas do BBI, ressaltam ainda como positivo o aumento da cobertura de inadimplência, “pois ela cria as condições para que os ganhos comecem gradualmente a se recuperar nos próximos trimestres”.
Um outro destaque positivo foi o controle das despesas operacionais, “algo que foi fundamental para o resultado final estar alinhado com a nossa expectativa”, ressalta o BBI. Ajustada pela participação nos lucros, houve uma queda de 1% no trimestre, enquanto as despesas com pessoal cresceram cerca de 2%, mas foram compensadas pelas despesas gerais e administrativas (baixa de 0,3%).
“Com esse conjunto de resultados, vemos o Banco do Brasil em uma boa posição para começar gradualmente a recuperar o lucro nos próximos trimestres, um cenário que temos para todos os bancos de grande capitalização no país”, apontam Schabbel e Sofia.
O que esperar para a frente?
Apesar da boa visão sobre os resultados, por outro lado, os analistas do BBI observam que, para o Banco do Brasil, outros fatores devem continuar pesando sobre as ações, limitando o potencial de uma recuperação mais pronunciada. Entre eles, a recente saída do CEO, Rubem Novaes, e os riscos de o banco poder desempenhar um papel mais anticíclico em meio à pandemia do coronavírus, o que leva à recomendação neutra, com preço-alvo de R$ 45.
Desta forma, os próximos passos serão observados de perto pelo mercado.
A divulgação dos resultados do banco ocorreu em meio às expectativas de troca de comando no BB. Alegando motivos familiares e cansaço com o ambiente político de Brasília, Novaes renunciou ao cargo e, em sua última teleconferência, como CEO, ressaltou: “tomei a decisão de passar o bastão entendendo que, ao fazer 75 anos neste mês de agosto, estaria na hora de ceder o lugar para alguém mais jovem”.
Seu substituto, ao menos até aqui, deverá ser o diretor do HSBC, André Brandão, ainda não oficializado no cargo. Dentre os desafios que o executivo terá estão uma agenda de desinvestimentos, já em curso, mas atropelada pela pandemia, e ainda preparar o banco público para a revolução tecnológica que tem transformado o setor financeiro.
Contudo, mesmo de saída, Novaes deu algumas indicações sobre quais podem ser os próximos passos do banco. Em paralelo ao resultado, o BB anunciou que vai investir mais R$ 2,3 bilhões em tecnologia nos próximos três anos e também confirmou o lançamento de um plano para aportar recursos em novatas da tecnologia.
O aporte adicional de R$ 2,3 bilhões para tecnologia e analytics, conforme o banco, visa a “oferecer aos clientes novas experiências com opções mais práticas, seguras e rápidas no mundo digital”. A instituição explica que, além de potencializar parcerias, o programa de startups traz benefícios como intercâmbio cultural com as novatas, permite identificar e antecipar tendências e acelera o desenvolvimento de novas soluções.
Ainda durante a teleconferência, o presidente demissionário do BB ressaltou que estão em andamento discussões com o Bradesco sobre divisão de ativos no setor de cartões. Os dois bancos dividem o controle da empresa de meios de pagamentos Cielo (CIEL3), a maior do país, e a venda da participação do BB já chegou a ser cogitado anteriormente, podendo ser acelerada na nova gestão.
Assim, enquanto passa por essa transição na presidência do banco, a companhia ainda terá que lidar com questões como aumento da concorrência – que está buscando endereçar em meio aos maiores investimentos em tecnologia – e em um ambiente de aumento de impostos a ser discutido no Congresso Nacional.
Neste cenário, enquanto o BBI está mais cauteloso, outros analistas veem desafios para o BB, mas também enxergam oportunidades de ganhos, também ressaltando a forte queda das ações no ano, superior a 30%. “Reiteramos nossa recomendação de compra e preço alvo de R$ 43,00 baseado na posição defensiva do banco e em múltiplos atrativos”, avalia a XP Investimentos, enquanto o Credit Suisse tem recomendação outperform, com preço-alvo de R$ 41. O próximo grande evento para a instituição agora será a confirmação do novo CEO – e as sinalizações que ele dará sobre os desafios a serem enfrentados pelo banco.
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