Santander Brasil: por que a queda de mais de 40% do lucro foi celebrada por investidores e analistas?
julho 29, 2020SÃO PAULO – Assim como ocorreu com relação aos números dos primeiros três meses do ano, os resultados do Santander Brasil (SANB11) do segundo trimestre são bem recebidos pelo mercado, com as units do banco registrando alta de até 6,6% na Bolsa brasileira e operando com ganhos expressivos, de cerca de 3%, durante a sessão desta quarta-feira (29).
Contudo, ao contrário dos números reportados com relação aos primeiros três meses do ano, desta vez a reação é mais contida – e também há uma menor contradição entre como o mercado reagiu e o que os analistas acharam do resultado.
Vale lembrar que, entre janeiro e março, o banco lucrou R$ 3,77 bilhões, em expansão de 10,5% sobre igual período de 2019, o mesmo percentual se considerado o lucro gerencial, que totalizou R$ 3,853 bilhões. O número surpreendeu e muito o mercado, uma vez que a expectativa era por fortes provisões para perdas que impactariam essa linha do balanço – isso por conta da expectativa de maior inadimplência em meio ao impacto do novo coronavírus na atividade econômica.
Porém, as provisões não vieram, com a justificativa da gestão da instituição financeira de que ainda não havia clareza no cenário. Isso acabou gerando maior cautela por parte dos próprios analistas do que estaria por vir, levando também em conta a alta participação da carteira do banco no segmento de varejo, potencialmente bastante impactada pela crise. Com isso, enquanto os analistas destacam ter cautela com o papel, as units da instituição financeira saltaram 11,47% na sessão do dia 28 de abril de 2020, logo após a divulgação do resultado.
Vale destacar, contudo, que no acumulado de 2020 (bastante negativo para os bancos em meio a preocupações com aumento de taxação e preocupação com concorrência), o Santander se destaca como a maior queda entre as ações das grandes companhias do setor bancário listadas na Bolsa. Enquanto Itaú (ITUB4) e Bradesco (BBDC4) veem seus papéis caírem na casa dos 20% no ano e Banco do Brasil (BBAS3) tem baixa de cerca de 32%, mesmo com a alta desta sessão as units SANB11 registram perdas superiores, de 35%.
Desta forma, os números apresentados nesse exercício, ainda que à primeira vista possam parecer negativos, significam uma espécie de redenção para a companhia após a falta de provisões no primeiro trimestre, animando investidores e analistas.
Entre abril e junho, o banco divulgou lucro societário de R$ 2,03 bilhões no segundo trimestre, queda de 41% frente o mesmo período do ano passado, e abaixo da menor estimativa entre analistas, segundo o consenso Bloomberg.
Grande parte desse resultado ocorreu em meio à despesa líquida com provisão de devedores duvidosos, que somou R$ 6,53 bilhões, patamar 91% maior do que no trimestre anterior. O banco informou que constituiu R$ 3,2 bilhões em despesas de provisão extraordinária no trimestre feito por conta da pandemia do novo coronavírus.
Aumento comemorado das provisões
Sob os reflexos da pandemia, o lucro líquido no primeiro semestre foi de R$ 5,989 bilhões, redução de 15,9% na comparação com o mesmo intervalo de 2019. Com o reforço nas provisões, o retorno sobre o patrimônio líquido (ROE, na sigla em inglês) também foi atingido, com a rentabilidade do banco despencando de 22,3% no primeiro trimestre para 12,0% no segundo.
Porém, os números não assustaram os investidores e nem os analistas que, inclusive, apontaram os pontos positivos da maior provisão.
Conforme destaca o Bradesco BBI, embora possa parecer contra-intuitivo, uma vez que provisão em alta pode ser vista como um sinal de deterioração da qualidade dos ativos, o aumento substancial registrado no segundo trimestre deve colocar o Santander Brasil mais próximo de seus pares quando se trata de registrar ganhos recuperáveis nos próximos períodos.
“A probabilidade de ter o banco como ‘retardatário’ em termos de ganhos nos próximos trimestres diminuiu com a adição feita à cobertura da inadimplência agora no segundo trimestre. Consequentemente, tendemos a ver os resultados como marginalmente melhores do que se esperava anteriormente”, destaca Victor Schabbel, analista do BBI. O índice de cobertura – relação entre empréstimos inadimplentes e provisões – passou de 194% no primeiro trimestre para 272% no segundo.
Porém, não é só isso: Schabbel ressalta que o desempenho do resultado financeiro foi mais forte do que o esperado, com maior resiliência da margem financeira bruta (NII, na sigla em inglês).
A XP ressalta que a NII foi 10% acima das expectativas em R$ 13,6 bilhões, impulsionada principalmente pelo resultado da tesouraria, que se beneficiou da queda da taxa de juros em renda fixa (ALM) e um menor custo de captação. A margem financeira sobre os ativos rentáveis (NIM) permaneceu estável em 7%.
“Isso foi apenas parcialmente compensado pelas receitas com tarifas mais fracas, que eram, em certa medida, esperadas pelo mercado”, avalia o Bradesco BBI. A receita de serviços foi 4% acima das expectativas da XP, para R$ 4,1 bilhões, com uma queda de 8% no trimestre, considerada positiva devido ao isolamento que foi mais rígido no segundo trimestre.
Na mesma linha, Marcel Campos, analista da XP Investimentos, aponta que, apesar do lucro abaixo da estimativa do mercado, houve melhora na qualidade dos ativos. Isso por conta da queda do índice de inadimplência acima de 90 dias, que foi para 2,4% (baixa de 68 pontos-base), impactando positivamente no índice de cobertura. “Lembramos que o alto índice de cobertura será importante, ao passo que a inadimplência deve aumentar ao final do ano e no início de 2021”, avalia.
Já com relação às despesas, o destaque ficou para a linha de pessoal, com baixa de 4% na base anual. O banco fechou 50 agências no País e demitiu 844 funcionários durante o segundo trimestre.
Vale destacar que o banco, assim como os rivais, assumiu o compromisso de não desligar trabalhadores por conta da covid-19, aderindo, inclusive, ao abaixo assinado ‘Não Demita’. Contudo, no início de junho, as demissões feitas pelo Santander Brasil começaram a se tornar públicas diante das declarações do Sindicato dos Bancários de São Paulo, Osasco e Região. O banco explicou, na ocasião, que o compromisso de não demitir havia terminado em maio.
O Santander Brasil encerrou junho com 46,348 mil funcionários no País ante 47,192 mil em março. Já a rede de agências físicas somava 2.209 unidades contra 2.259, respectivamente.
As despesas gerais do Santander Brasil, que incluem gastos administrativos e pessoais, totalizaram R$ 5,191 bilhões no segundo trimestre, queda de 1,9% frente ao primeiro. Em um ano, ficaram praticamente estáveis, com queda de 0,2%. De acordo com o Santander, houve maior gasto com processamento de dados para suportar a transformação digital do banco, intensificada nos últimos meses em meio à pandemia, e o aumento das transações de autoatendimento.
Pontos a monitorar
Apesar dos dados em geral sendo bem recebidos, os analistas apontaram alguns pontos a serem monitorados pelos investidores.
O Santander divulgou um aumento de 24% em sua carteira renegociada para R$ 21 bilhões, enquanto as provisões para a mesma carteira aumentaram apenas 13%. As renegociações subiram R$ 4 bilhões em relação ao trimestre anterior. “Acreditamos que os investidores devem manter esta linha no radar, ao passo que o banco interrompeu o período de carência em junho. Portanto, as renegociações devem aumentar”, avalia Campos, da XP.
Neste sentido, o BBI destaca que um outro ponto de atenção reside na sustentabilidade da NII, apontando que as operações de crédito estão sendo naturalmente provisionadas no momento uma vez que a qualidade dos ativos permanece sob controle. “Contudo, uma deterioração nessa frente (que deve acontecer) pode afetar negativamente a capacidade de qualquer banco de reconhecer receitas futuras e isso deve ser um ponto de atenção também para o Santander Brasil”, avalia.
Assim, as renegociações de crédito e de rolagem da dívida devem desempenhar um papel extremamente importante quando se trata do desempenho da carteira de crédito, tanto no crescimento quanto na qualidade dos ativos.
Já o Morgan Stanley destaca que, apesar da alta expressiva dos índices de cobertura de inadimplência, eles ainda parecem menores em termos absolutos e relativos frente seus pares, o que indica que provisões mais expressivas serão necessárias nos próximos trimestres.
Contudo, em coletiva para a imprensa, Sergio Rial, presidente-executivo do banco, afirmou que provavelmente novas provisões não serão necessárias.
Rial apontou que não está claro como a inadimplência vai se comportar, diante das atuais incertezas, mas pontuou que a queda na taxa de juros e medidas de ajuda aprovadas pelo governo para empresas e pessoas físicas deve ajudar a conter a deterioração da qualidade dos ativos.
“Não ousaria fazer previsões agora”, disse ele ao ser questionado sobre a perspectiva para as taxas de inadimplência do banco. Como os clientes receberam um período adicional de 90 dias para o vencimento das dívidas, a inadimplência verificada no segundo trimestre ainda não refletiu de forma completa as potenciais perdas com empréstimos.
A Levante Ideias de Investimento ainda destaca um outro ponto: a elevação da concorrência de fintechs, corretoras e bancos digitais, umas das principais razões para a redução na sua receita de tarifas e serviços. A divisão de cartões e adquirência (Getnet) que enfrenta a “guerra das maquininhas” apresentou queda de 16,5% na receita no primeiro semestre de 2020.
“Por outro lado, o índice de Basileia de melhor qualidade (CET1) continua em um patamar confortável de 14,4%, mostrando a eficiência na alocação de capital ponderada pelo risco e sem a futura necessidade de aumento de capital, o que implicaria em diluição dos acionistas e menor ROE”, apontam os analistas da casa de análise.
Os preferidos do setor
Com todas essas questões sendo levadas em conta – e também considerando o noticiário bastante desafiador para o setor, os analistas se dividem sobre as preferências para o setor.
Campos, da XP, segue com recomendação neutra e preço-alvo de R$ 32 para os ativos. Apesar de estar otimista para o setor como um todo, ainda mais em meio à forte queda dos papéis no ano, ele acredita que os múltiplos do Santander estão comparativamente caros. Essa é a mesma recomendação do UBS que, apesar de avaliar que o preço do ativo não está caro em relação aos seus pares, mantém a preferência por Bradesco e Itaúsa (ITSA4) e, em seguida, por Itaú.
Por outro lado, o Itaú BBA possui recomendação outperform (desempenho acima da média) e preço-alvo de R$ 45 para os ativos, destacando o valuation atrativo, enquanto o BBI tem a mesma recomendação, mas com o preço-alvo ainda maior, de R$ 48. Na mesma linha, mas com um preço-alvo mais modesto, de R$ 36, está o Credit Suisse, que aponta desconto excessivo dos ativos.
“Também vemos o resultado do Santander Brasil como um gatilho positivo para as ações dos bancos e reiteramos nossa posição positiva para o setor que, em nossa opinião, continua subvalorizado, mesmo sob premissas conservadoras”, avaliam Marcelo Telles, Otavio Tanganelli e Alonso Garcia, analistas do Credit. Vale destacar que o Itaú é o top pick do setor para os analistas do banco suíço, dada a melhor cobertura de provisões e uma base de clientes mais resiliente em relação aos pares, melhor dinâmica de taxas e forte controle de custos.
Os ativos dos demais bancos também registram ganhos nessa sessão, de cerca de 2%, na esteira dos dados do Santander Brasil. Contudo, apesar da visão considerada positiva para o setor pela maior parte dos analistas, os principais riscos seguem no radar e movimentando os papéis. São eles: i) a elevação da concorrência; ii) open banking e novo sistema de pagamentos PIX e o iii) possível aumento de impostos a ser discutido no Congresso.
Enquanto isso, as instituições seguem monitorando as tendências de aumento da inadimplência e os demais impactos na economia causados pelo novo coronavírus. O Santander Brasil, com este resultado, conseguiu mostrar resiliência e também diminuir a sua diferença de provisões em relação aos pares – contudo, muitos pontos estão sendo monitorados de perto pelo mercado, com possível impacto nas ações.
(Com Agência Estado e Bloomberg)
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