Mourão quer dinheiro do Fundo Amazônia fora dos limites fiscais
julho 15, 2020O vice-presidente da República, Hamilton Mourão, afirmou aos senadores nesta terça-feira (14) que, entre os seus planos para o futuro do Fundo Amazônia, está a separação das verbas desse fundo do restante do Orçamento, para que elas não sofram restrições fiscais.
Segundo Mourão, devido à “âncora fiscal” do teto de gastos (Emenda Constitucional 95), o crescimento de despesas obrigatórias da administração pública — como salários e aposentadorias — reduz a capacidade de investimentos do governo. Com isso, é preciso fazer cortes em ações importantes. Para ele, o dinheiro captado do exterior para a preservação ambiental não deveria estar sujeito a essa restrição.
“A questão orçamentária é minha preocupação precípua. Temos que ter uma linha de ação para que os recursos externos, sejam os relacionados ao Fundo Amazônia ou a outras contribuições que venham, sejam independentes e não impactem no orçamento”.
Mourão afirmou que encaminhará uma proposta ao Congresso Nacional tratando desse assunto, mas não deu detalhes sobre como a ideia seria operacionalizada. Ele destacou também que, mesmo apartadas do orçamento, as verbas desse fundo continuariam sob fiscalização. O responsável seria o Conselho do Fundo Amazônia (Cofa), órgão que foi extinto em 2019 e está em reformulação.
“O comitê terá um caráter estratégico para, a cada dois anos, definir quais são os projetos prioritários em termos de estratégia, e os projetos serão avaliados pela equipe do BNDES [Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social]“, antecipou o vice-presidente.
Combate
Mourão falou aos senadores em sessão de debates remota, por videoconferência, sobre as ações do governo federal para combater o desmatamento na Amazônia. O vice-presidente comanda o Conselho Nacional da Amazônia Legal (CNAL), órgão responsável pela gestão do Fundo Amazônia.
Ele foi questionado sobre mudanças na estrutura do Ministério do Meio Ambiente, que alguns parlamentares veem como “desmonte”. A senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA), uma das responsáveis pelo convite para que Mourão viesse ao Senado, lembrou da interrupção do andamento de acordo comercial entre o Mercosul e a União Europeia. Países europeus signatários do tratado citam o retrocesso da política ambiental brasileira como um obstáculo.
“O presidente [Jair] Bolsonaro sempre deixou muito claro que a preservação do meio ambiente não teria nenhuma prioridade no seu governo. A governança ambiental foi praticamente toda desmontada. Essa intransigência começa a prejudicar a economia brasileira”, criticou ela.
Os senadores Fabiano Contarato (Rede-ES) e Kátia Abreu (PP-TO) também questionaram Mourão sobre cortes de verbas para o combate ao desmatamento. Contarato também citou um “aparelhamento” dos órgãos ambientais pelas Forças Armadas, e Kátia lamentou prejuízos ao setor agropecuário com as incertezas sobre a situação da Amazônia.
Mourão relatou que a estrutura funcional do setor ambiental já vem se deteriorando desde o início da década passada, o que encerrou um ciclo positivo de redução do desmatamento no Brasil.
“A crise internacional traz o aperto orçamentário e, como consequência, diminuem as ações. Ao mesmo tempo, inicia-se o processo de desmantelamento das agências pela perda do seu pessoal, que vai se aposentando. Hoje, tanto o Ibama como o ICMBio estão com 50% de efetivo, sendo que dois terços trabalham no ar-condicionado, porque o concurso deles é de agente administrativo, e não de fiscal”, disse o vice-presidente.
Quanto à denúncia de interferência militar no setor, Mourão assegurou que o quadro real é de cooperação.
“Exatamente porque as nossas agências ambientais perderam sua capacidade operacional elas necessitam de apoio. As Forças Armadas estão dando apoio logístico e de segurança para os agentes. Elas não estão substituindo agências ambientais”, respondeu Mourão.
Exploração
O senador Telmário Mota (Pros-RR), que também solicitou a audiência com o vice-presidente, defendeu a regularização da exploração de minérios da Amazônia, inclusive em terras indígenas. Para ele, a atividade econômica sustentável na floresta é imprescindível, e o Brasil precisa conduzi-la nos seus próprios termos.
“Nós não podemos balizar as nossas políticas públicas da Amazônia por interesses internacionais. A Amazônia é nossa. Como vamos desenvolver os estados se não for pelo setor primário? Como vai crescer a indústria se não houver o setor produtivo? É importante a integração de forma responsável”, argumentou o senador.
O vice-presidente reconheceu a presença de garimpeiros ilegais na região, mas observou que a sua retirada não é uma operação simples. Segundo ele, esse problema precisa ser melhor prevenido.
“O garimpo ilegal na Amazônia não se resolve só com a repressão. A Funai tem que ter quatro bases permanentes atuando, como forma de dissuadir o ingresso desses garimpeiros na terra indígena. Nós não podemos continuar eternamente dependendo de ações das Forças Armadas. Por isso, eu destaco a questão da recuperação operacional das agências de fiscalização”, afirmou Mourão.
Os senadores Eduardo Braga (MDB-AM) e Luis Carlos Heinze (PP-RS) pediram atenção ao problema da regularização fundiária de terras na Amazônia — ou seja, a resolução de conflitos sobre a ocupação da terra e a titulação de propriedades assentadas. Braga assinalou que está em questão o “reconhecimento” dos habitantes da região, e Heinze pediu a colaboração financeira do setor privado.
Mourão concordou com a demanda, afirmando que, sem a regularização fundiária, o Brasil está como “um cachorro correndo atrás do rabo” no tocante à repressão de ocupações na floresta. Ele citou como dificuldade a ausência de uma base cartográfica ampla da Amazônia.
“O proprietário na Amazônia tem que ter o seu título de terra para ter acesso a financiamento e, principalmente, a assistência técnica rural, porque aí nós vamos aumentar a nossa produtividade”, declarou o vice-presidente.