Bolsonaro demite Luiz Henrique Mandetta do Ministério da Saúde
abril 16, 2020SÃO PAULO – Após sucessivos embates públicos, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) comunicou, nesta quinta-feira (16), a demissão de Luiz Henrique Mandetta do comando do Ministério da Saúde. O movimento era aguardado desde a semana passada e foi confirmado em uma reunião convocada às pressas pelo presidente nesta tarde.
As últimas semanas foram de tensão entre o presidente e o agora ex-ministro, em meio às discordâncias sobre as medidas para combater o novo coronavírus. De acordo com o mais recente boletim do ministério, divulgado hoje, o Brasil chegou a 1.736 mortes provocadas pela doença e ao menos 28.320 casos confirmados.
No centro das divergências entre os dois estavam medidas de isolamento social implementadas por governadores e prefeitos – endossadas por Mandetta – e o uso do medicamento hidroxicloroquina no tratamento da doença – defendido enfaticamente por Bolsonaro.
Durante a crise, o presidente chegou a se referir à doença como “gripezinha” ou “resfriadinho” e adotou postura crítica a políticas mais duras de enfrentamento à pandemia, contrariando recomendações de autoridades sanitárias nacionais e internacionais.
Bolsonaro é defensor da reabertura das atividades, sob alegação de severos impactos econômicos causados pela quarentena. O presidente sugere o chamado “isolamento vertical”, que consiste em restrições apenas para grupos considerados de risco, como idosos e portadores de doenças crônicas.
As posições do mandatário contrastam com o que defende a maior parte da população, como indicam pesquisas recentes, por isso custaram apoio da sociedade ao governo e motivaram uma onda de panelaços em diversas cidades do país.
A perda de popularidade do presidente e a contrastante conquista de forte apoio popular pelo ministro – e por governadores, que se tornaram os principais adversários políticos de Bolsonaro na crise – foi mais um ponto a colocar os dois em rota de colisão.
No início do mês, Bolsonaro já havia exposto sua insatisfação com o então ministro. Em entrevista à rádio Jovem Pan, disse que “faltava humildade” a Mandetta.
Dias depois, em conversa com apoiadores em frente ao Palácio do Alvorada, afirmou que “algumas pessoas” do seu governo “de repente viraram estrelas e falam pelos cotovelos” e que não teria medo de usar a caneta contra eles. Foi o que quase aconteceu nove dias atrás, mas o movimento acabou debelado pela ala militar do governo.
O clima de trégua durou até o último fim de semana. No sábado (11), Mandetta participou de uma visita com Bolsonaro ao primeiro hospital de campanha do governo federal, em construção no município de Águas Lindas (GO). A visita também contou com a participação do governador de Goiás, Ronaldo Caiado (DEM), que havia anunciado rompimento com o presidente. Depois do encontro, Bolsonaro deixou o local e andou para conversar e cumprimentar apoiadores que se aglomeraram para vê-lo.
Na ocasião, o ministro limitou-se a dizer que não julga ninguém e que a recomendação pelo distanciamento social “vale para todos os brasileiros”. No dia seguinte, porém, em entrevista ao programa Fantástico, da TV Globo, pediu um discurso unificado do governo e disse que o brasileiro não sabe se escuta ele ou o presidente.
O tom incomodou ministros da ala militar do governo, que viram no gesto um novo confronto com o mandatário e um desprezo aos esforços por acalmar os ânimos. O desembarque deste grupo foi decisivo para a confirmação da demissão de Mandetta.
Desdobramentos
A saída de Luiz Henrique Mandetta do Ministério da Saúde pode exacerbar riscos para o governo em meio à escalada do novo coronavírus no Brasil. Para os analistas políticos da Eurasia Group, o presidente pode sofrer com uma nova onda de perda de popularidade e cruzar um ponto sem volta na estratégia de disputa contra governadores sobre o isolamento social.
Os especialistas também chamam atenção para a possibilidade de membros do primeiro e segundo escalões da pasta deixarem seus postos em solidariedade ao ex-ministro, o que pode deixar vagos postos-chave em meio a uma grave crise provocada pela doença.
Da mesma forma, é esperada uma piora na interlocução entre governadores, responsáveis pela prestação de serviços de saúde, e o governo federal, além de uma maior confusão na comunicação à população sobre medidas restritivas de enfrentamento à pandemia. Uma consequência disso seria a redução no cumprimento das recomendações e mais pessoas nas ruas – o que aumenta o risco de contágio e a velocidade da evolução da doença.
Para Rafael Cortez, analista político da Tendências Consultoria Integrada, o movimento é resultado de uma busca por restauração de autoridade por Bolsonaro e uma tentativa de modificar a estratégia de enfrentamento à Covid-19. Como pano de fundo desta questão estão questões como o endosso do presidente ao uso da hidroxicloroquina já na fase inicial de tratamento da doença, embora os efeitos ainda estejam em fase de estudos.
Mais informações em instantes.
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