Governo tenta reverter derrota na Câmara com R$ 77 bi a estados e municípios
abril 14, 2020SÃO PAULO – Um dia após o plenário da Câmara dos Deputados aprovar, em sessão virtual, um projeto de socorro a estados e municípios durante a crise do novo coronavírus, o governo federal mobiliza esforços para instituir um plano alternativo de sua preferência na concessão de auxílio a governadores e prefeitos.
Apesar das alterações em relação ao texto discutido na semana passada, a versão final do substitutivo apresentado pelo relator, o deputado Pedro Paulo (DEM-RJ), desagradou membros da equipe econômica do governo – embora tenha conquistado a simpatia da grande maioria dos líderes partidários.
O projeto, aprovado por 431 votos a 70 pelos deputados, estabelece uma ajuda do governo federal a estados e municípios na recomposição da queda de arrecadação do ICMS e do ISS entre abril e setembro deste ano, em função dos impactos provocados pela pandemia da Covid-19.
Na prática, trata-se de uma espécie de “seguro” aos governadores e prefeitos, dando condições para a continuidade na prestação de serviços considerados essenciais à população. Segundo o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), defensor do texto, haverá uma queda de arrecadação entre 30% e 40% para estados e municípios na crise.
O auxílio financeiro dado pela União corresponderá à diferença nominal, se negativa, entre a arrecadação dos dois impostos de cada unidade da federação e município nos meses de abril, maio, junho, julho, agosto e setembro.
O texto também autoriza a Caixa Econômica Federal e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) a negociarem a suspensão dos pagamentos devidos por estados e municípios. Nos cálculos do relator, o impacto fiscal total das medidas é de R$ 89,6 bilhões.
Membros da equipe econômica discordam da conta e dizem que os efeitos do desenho criado são de difícil estimativa, já que poderiam estimular a má gestão tributária por prefeitos e governadores.
Neste raciocínio, eles argumentam que faria sentido manter isenções tributárias e uma fiscalização leniente com sonegações durante a vigência da medida, já que qualquer perda de arrecadação seria compensada pela União.
Para eles, a melhor solução seria garantir um repasse fixo aos entes, o que poderia dar maior previsibilidade sobre os impactos da medida e não geraria incentivos indesejados.
De acordo com simulações apresentadas pelo assessor especial do Ministério da Economia, Esteves Colnago, se as receitas com ICMS e ISS caírem, em média, 30%, o repasse federal pode ser de R$ 85,5 bilhões. Mas, se houver queda de 50%, a compensação passaria para R$ 142,5 bilhões, por exemplo.
Além disso, o prazo de seis meses estipulado pela versão aprovada do texto é considerado excessivamente longo pelos técnicos, que alegam que no momento as medidas anunciadas pelo governo têm tido efeito de três meses.
Apesar dos pontos de divergência, a equipe econômica elogiou ajustes feitos no texto, que excluíram pontos como a possibilidade de contratação de crédito adicional de até 8% da receita corrente líquida por estados. Na avaliação deles, a medida poderia piorar dramaticamente a situação fiscal dos governos e ainda desestimular a adesão ao chamado “Plano Mansueto” (que exige o cumprimento de determinadas medidas fiscais em troca de alívio financeiro) em um momento pós-crise.
Em um dos flancos, membros da equipe econômica tentam convencer os senadores da necessidade de ajustes no texto, que tem por objetivo compensar governadores e prefeitos das perdas de arrecadação com impostos em um contexto de necessidade de recursos no enfrentamento à doença e seus impactos de saúde pública, sociais e econômicos.
Nesta terça-feira (14), o governo anunciou um pacote de R$ 127,7 bilhões em ajuda aos estados e municípios. Os recursos contemplam um auxílio de R$ 40 bilhões no enfrentamento da crise; um alívio de R$ 37,7 bilhões com a suspensão de dívidas dos estados com a União – o que já tem sido decidido pelo Supremo Tribunal Federal (STF) – e com bancos públicos; além de R$ 49,9 bilhões em medidas já anunciadas.
A proposta foi apresentada em coletiva de imprensa no Palácio do Planalto pelo secretário especial da Fazenda, Waldery Rodrigues. O plano já vinha sendo discutido com líderes na Câmara dos Deputados, mas havia divergências quanto às regras de distribuição dos recursos.
O governo defendia que, dos R$ 40 bilhões, uma fatia de R$ 22,5 bilhões seriam recursos livres para governadores e prefeitos gastarem, divididos por cada estado e município de acordo com a população de cada um.
Ainda há dúvidas sobre a melhor estratégia – se articular o pacote diretamente com os senadores ou se apresentá-lo na forma de uma medida provisória (para os repasses) e um projeto de lei (para a suspensão das dívidas).